Palhaço por vocação

>> sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Depois da onda politizada que invadiu esse blog, resolvi escrever sobre a segunda coisa que me emocionou de alguma forma nessa semana.

Assisti na última terça-feira o filme O palhaço, do Selton Mello. Fui pega de surpresa por um filme que veio falar diretamente com as minhas crises e neuras desse ano complicado de 2011.

Se você não conhece o filme, antes de ler o comentário que segue de uma expectadora comovida, sugiro que você clique aqui e volte daqui uns 10 minutos e alguns cliques.

 As boas e positivas críticas do filme têm apontado o cuidado da direção de arte, os acertados planos geométricos, a justa homenagem aos circos itinerantes e aos grandes ícones da comédia brasileira, o bom gosto da trilha sonora, entre outros desses aspectos técnicos e artísticos.

Meus aspectos são puramente emotivos. A história de Benjamin é também a minha história - ou uma história que poderia ser minha.

(a partir daqui o texto tem informações sobre o desenrolar e o final do filme)

A história de Benjamin é a história de alguém que está saturado do seu trabalho - saturado de viver o circo dentro e fora do picadeiro, como palhaço e como administrador. Saturado de ter que ser "o" responsável por tudo o que acontece, de ser o balcão de reclamações dos outros integrantes do circo, de ter tanta coisa pra resolver.

Quando essa saturação chega a um nível crítico, algo de fora parece convidá-lo a sair dessa realidade de trabalho e problemas a serem resolvidos. O ventilador. O ventilador é movimento, e está em todos os lugares - menos no circo.O ventilador é aquilo de novo que vai trazer alguma forma de alívio e que ele só vai encontrar se estiver fora do circo.

Enquanto essa alucinação que está fora chama nosso amigo Benjamin, por dentro, a confusão só aumenta: "Eu faço todo mundo rir... mas quem é que vai me fazer rir?". Benjamin não sabe mais qual é sua vocação. Não sabe mais ser palhaço, e parece não saber mais interagir com as pessoas, porque está ocupado num tremendo esforço interno de descobrir quem ele é. Quem o vê de fora acha isso "engraçado" (quantas vezes você já esteve na preseça de uma pessoa internamente confusa ou em contradição e disse "você é engraçado?)

Quando o convite daquilo que é externo torna-se irresistível, Benjamin decide partir. Entrega-se ao novo com coragem e determinação, na busca ansiosa de descobrir se esse novo preencherá o vazio que ele sente.

Não preenche. Num ato ainda mais corajoso, Benjamin volta. Volta porque, longe, descobriu novamente a alegria de fazer alguém rir. No final feliz do filme de Selton Mello, Benjamim tem a coragem de voltar para o que abandonou - não porque estivesse arrependido, se não tivesse partido nunca reconheceria sua vocação, mas porque só a distância de tudo o que ele conhecia e amava pôde reconciliá-lo com sua própria identidade.

***

Conhecemos outros finais não tão felizes em que a distância só aumenta a angústia e a solidão, e a frustração e vergonha de ter ser se venturado no novo e  não ter dado certo impede tantos palhaços de voltar pra casa; ou em que falta a coragem de largar tudo, e o palhaço termina encerra seus dias fazendo os outros rirem de sua própria tristeza. Em outro tipo de final feliz, Benjamin poderia ter descoberto que o Aldo da Aldo Auto Peças era na verdade pai de Ana, poderia ter se casado com ela e mandado um cartão de natal com uma foto de sua família para o circo, ou visitado o circo com a sua prole.

O final não importa muito. O importante é a coragem de buscar. A coragem de enfrentar suas angústias, de perseguir o novo - ou o ventilador, de reconhecer que o presente não está bom do jeito que está - por mais que a gente ame o lugar e as pessoas desse presente.

***

Em pouco mais de uma hora, vemos Benjamin começar e resolver sua crise de vocação e identidade. Quando eu disse ali em cima que essa poderia ser também a minha história, não quis dizer que também vou abandonar o circo em que vivo e ir atrás de ventiladores. Quis e quero dizer que a minha história também é a de alguém que está buscando e se questionando. Mas, em vez de pouco mais de uma hora, espero ter uma vida inteira para achar meu final - torçamos para que seja feliz - ou meu ventilador, ou meu picadeiro. Ver Benjamin encontrar seu caminho foi como ver um alguém que acaba de enfrentar um desafio que estamos prestes a enfrentar e pensar: se ele conseguiu, eu também consigo!

- O gado bebe leite, o rato come queijo, e eu? Eu pergunto.

Read more...

Refém da informação

>> quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Estive alheia aos acontecimentos dessa semana na USP até o início da manhã de hoje. Ouvi falar sobre o assunto, mas não quis ir atrás de entender melhor o "bafafá" pra opinar porque pensei que fosse só mais uma ocupação de estudantes dessas que nós estamos acostumados aqui na UnB.

Quando a minha página do facebook foi inundada pela já "emblemática" reportagem da revista Veja sobre a ocupação, me rendi à curiosidade e li a tal da matéria: uma explosiva combinação de irresponsabilidade, deboche e falta de compromisso com a notícia.
Com uma ironia mais do que forçada, nada sutil, nada profissional, nada ética, o "jornalista" escreveu o que qualquer direitista conservador falaria sem pensar duas vezes, muito tranquilamente, entre os amigos (ou pra provocar as inimizades) ou nas suas redes sociais - como muitos fizeram, com todo o direito, e não há nada de errado nisso. 

Mas quando esse comentário pessoal ganha a projeção de uma revista de circulação nacional, status de voz do povo, de prova testemunhal irrefutável, de fato jornalístico, fruto de uma investigação conprometida, há algo de muito errado, de muito preocupante, algo que mexeu comigo de uma forma que eu mesma não consigo explicar, e me motiva a escrever esse texto agora.

Fui, então, procurar outras fontes para me informar. Reportagens do G1, Folha de S. Paulo, Estadão e outros desse calibre repetiam mecanicamente o mesmo discurso,palavra por palavra: "meia dúzia de estudantes maconheiros vandalizaram a Reitoria, salve a polícia, defensora da pátria, de seu patrimônio e dos demais cidadãos de bem, inclusive você, querido leitor!"

Me senti refém da mídia. Quis saber mais sobre o assunto mas não consegui. Não pude achar sequer uma reportagem séria, minimamente respeitosa, que não fosse contaminada por um deboche rasgado ou uma paixão política inflamada, tanto de direitistas quanto de esquerdistas. Somente lendo artigos de opinião (obrigada às amigas uspianas pelas indicações) assinados por pessoas que tem posições políticas claras e públicas - e que não quiseran elevar seu discurso ao status de verdade absoluta - pude ter uma ideia do que aconteceu.

O objetivo desse post não é dizer quem está certo ou errado nessa história. Estudantes e polícia entram em choque desde sempre, defensores de uns e de outros têm todo o direito de divulgar suas opiniões sobre o assunto, fortalecendo o debate histórico-ideológico. 

A pretensão é de que fique aqui registrada uma preocupação muito forte, muito séria, com o estado da nossa mídia. A pretensão é de que fique aqui registrada a vontade que eu tenho agora de ajudar a construir e consolidar uma terceira opção de mídia, de comunicação, que não seja isso que se chama de "grande mídia", que dispõe de todos os recursos econômicos e influências políticas pra armar o circo que quiser, dar a notícia que quiser; nem seja a suspeita e autoproclamada democracia digital que resulta em um monte de gente compartilhando reclamações e declarações aleatória e irrefletidamente, gritando, se irritando, xingando, "se indignando", produzindo um barulho ensurdecedor que não frutifica, que não reverbera, que não espera pra escutar uma resposta. Que compartilha e fecha a página, que "curte" e faz logout.

Que terceira opção seria essa? Ainda não sei. Sei que não será imparcial, imparcialidade é um mito. Sei que não será apolítica, porque viver em sociedade é se relacionar politicamente. 
Torno público esse texto na esperança de que ele encontre leitores pensantes, críticos, divergentes, comprometidos,  que possam compreendê-lo, e, quem sabe, respondê-lo, contradizê-lo, frutificá-lo - na esperança de que ele já seja o começo dessa terceira via de comunicação, informação e troca de ideias que procuro.

Read more...

  © Blogger template Simple n' Sweet by Ourblogtemplates.com 2009

Back to TOP