não beijei (crônicadeviagem)

>> terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Renato se apaixonou por uma garota de programa de luxo? De verdade? Isso é tão romântico, tão Paris, ou Rio de Janeiro do século XIX e suas cortesãs! Mande-o ler Lucíola! (pensando melhor, não mande, ele pode querer que a tal Michele tenha o mesmo destino da pobre Lúcia...!)

Creio que a dor do rapaz foi causada mais pelo atordoamento de ver aquele beijo do que pela traição em si. Talvez se ela tivesse contado, ou se ele só percebesse uma tensão sexual entre os dois, a reação não teria sido tão, digamos, drástica. Mas o beijo... aquele beijo! É quase como em Estômago, tirando a parte trágica...

Sem beijo visto, sabido e comprovado, não tem traição. 

João Pessoa, 2011.
Praia, céu, estrelas e um calor diminuído pela brisa vinda do atlântico. Era a última noite dessa viagem, a primeira desde que eu começara a trabalhar. Estava com dois amigos, feitos mais cedo naquela mesma noite, curtindo o gosto que sabia a "juventude" (se usa "sabe a" em português? acho essa expressão tão bonita!), de não ter que dirigir, de andar pela rua deserta, comprar bebida no mercado e beber na beira da praia, à luz do luar - tudo aquilo que ei deveria ter feito na adolescência, e que eu não teria a chance de fazer de novo ao voltar pra brasília.

Voltando pra casa, pro trabalho, pro namorado, lembrei muitas vezes da sensação de liberdade que tive naquela noite. Contraditoriamente, lembrei com um pouco de remorso. Ainda estava em dúvida se havia traído ou não meu compromisso ali também. Um dos amigos quis, digamos, estreitar os laços da amizade que nos unia. Não cedi, é claro, mas participei do jogo de sedução inspirado pela brisa que vinha do Oceano. Traí ou não traí? Será que a traição começou no momento em que eu permiti que o outro tentasse me seduzir? Essa simples conivência com o ataque do outro já é traição? 

Eu, como namorada traída em potencial,  diria, sem pestanejar: Claro! Como a namorada prestes a ser infiel, respondo que não: é até melhor deixar que o outro tente - para que a minha resistência tenha mais valor!

E resisti, de fato. Beijo não houve. Contra ele não haveria argumento teórico possível. Aceitar inerte as carinhos daquele que investe contra suas resistências, procurando miná-las com a força das reações do seu próprio corpo, é, acredito eu, desculpável. O beijo, não. O beijo é um acontecimento, uma iniciativa, uma manifestação ativa do seu desejo de experimentar o outro! Não há imparcialidade no beijo! Há dois atores rendidos um ao outro, conquistadores e conquistados ao mesmo tempo. Dominadores de quem os domina!

(Talvez esse seja só um pensamento conveniente para manter minha consciência tranquila)

Mas, voltando ao nosso amigo que presenciou o beijo indesculpável, me comprometo a tentar reverter esse coração rancoroso ao mesmo campo fértil para o amor que ele era antes. Vou te provar que existem amores na nossa cidade, sim! Não os inspirados pela brisa do mar, é verdade... mas os de outro tipo, inspirados pelo vento paciente e constante que dá a forma, torta, é verdade, mas única, das árvores do cerrado.

Mas isso você só vai perceber quando, como eu, não puder sentir mais esse vento.

Continue me mandando os resultados dos seus arroubos literários! Eles me mantêm mais perto de casa, mais perto de você.

Com saudade e afeto,
Alice.




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